53 pedidos de UTI são feitos por dia e ocupação é de 98%

Fonte: Gazeta Digital, créditos da imagem: Secom

Uma média de 53 pacientes solicitam, por dia, vagas em Unidade de Terapia Intensiva (UTI) na rede de saúde pública de Mato Grosso. Parte não consegue, mesmo com decisão liminar. De acordo com o Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES), o Estado de Mato Grosso conta com 590 leitos de UTI, distribuídos entre adulto, pediátrico e neonatal. No entanto, conforme a Secretaria de Estado de Saúde (SES-MT), a taxa de ocupação dos leitos de UTI está em cerca de 98%. O aumento na demanda tem sido motivado, principalmente, por casos de origem neurológica, como AVC e traumas, e cardiológica. Além de quadros respiratórios, como pneumonia e Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG).

Emília da Costa, 85 anos, morreu à espera de UTI. A filha, Adriana Gracielly, conta que foram três dias de internação na Unidade de Pronto Atendimento do Leblon e, mesmo com a indicação médica da necessidade da transferência para UTI, a idosa morreu por insuficiência respiratória, no dia 04 de abril. Foi um verdadeiro descaso, só porque minha mãe tinha 85 anos. Espero que outras pessoas não passem pelo que a minha mãe passou. Ela sofreu demais por falta de socorro, diz Adriana.

Ela conta que a necessidade de UTI surgiu após uma outra negativa, a de home care. Portadora de disfagia e Alzheimer, Emília, que se alimentava apenas por sonda, precisava do tratamento e teve uma liminar concedida pela justiça em setembro. Veio um médico do Estado e negou a home care para minha mãe. Acabou que a sonda dela furou e, desde dezembro, fomos aos hospitais para trocar, até compramos a sonda, mas a médica não sabia trocar. A Santa Casa liberou para trocar no dia 25 de abril. Mas minha mãe passou mal e eu a levei para UPA do Leblon, onde ela ficou internada, precisando de UTI por causa dessa sonda que não trocaram. Ela não aguentou tanta demora.

Pedidos por UTI

Dados do Sistema de Regulação SISREG III indicam que foram registradas, em média, 18 mil solicitações de leitos de UTI em 2024. Em 2025, até o dia 31 de março, já foram inseridos 4.801 pedidos no sistema. A indicação do leito é feita conforme a necessidade específica de cada caso. Para suprir a carência de leitos de UTI, a SES afirmou que está ampliando a rede hospitalar, com a construção de seis novos hospitais em Mato Grosso, além de realizar estudos para novos contratos com unidades de saúde.

Por outras Luizas

Se o Estado tivesse feito o dever dele e cumprido a decisão da Justiça, minha mãe hoje poderia estar conhecendo o neto dela. A fala de Valdemar Klein, 44, morador de Campo Verde, que atualmente trava uma batalha para que outras Luizas não morram à espera de leito em UTI. Ele e as duas irmãs perderam a mãe, Luiza Klein, de 67 anos, no dia 1º de fevereiro, em Cuiabá, após aguardar 15 dias pela UTI, mesmo com uma liminar deferida no dia 23 de janeiro. A família ingressou na Justiça com uma ação de indenização por danos morais, no valor de R$ 1 milhão, contra o Município e o Estado.

O Estado virou as costas pra gente, não sei se é porque somos pobres. O mais difícil é quando eu chegava para visitar minha mãe e ela perguntava se eu tinha conseguido leito de UTI e nada. É dolorido a gente pagar tanto imposto e na hora que precisa não ter. Hoje estamos órfãos de mãe, meu filho acabou de nascer e não vai conhecer o avó por negligência do Estado. Entramos com pedido na Justiça para que não fique impune. O dinheiro não vai trazer minha mãe, mas que sirva de lição para eles e que outras pessoas não passem o que nós passemos, que outras Luizas não morram, disse Valdemar.

Sentença de morte

Defensor público Bruno Cury de Moraes, que protocolou a ação para a família, afirma que o óbito da paciente não representa apenas uma estatística, mas a materialização do descaso do poder público, que vai muito além da omissão, e resultou em uma sentença de morte. O desfecho da inércia sistemática dos entes públicos culminou no óbito da Sra. Luiza Klein em 1º de fevereiro de 2025. A transferência só foi viabilizada mediante bloqueio judicial nas contas do Estado e do Município. Tragicamente, um dia após essa transferência tardia, Luiza Klein não resistiu – uma morte que carrega o peso incontestável da negligência estatal, diz trecho da ação.

Judicialização

Cleide Regina Ribeiro do Nascimento, defensora pública integrante do Grupo de Atuação Estratégica em Direitos Coletivos de Saúde (Gaedic Saúde), pondera que a judicialização revela as falhas estruturais do sistema de saúde. Cleide destaca que embora a saúde seja um direito garantido pela Constituição Federal, não está eficientemente aparelhada para atender toda a população, fazendo com que muitas pessoas precisem recorrer à Justiça. A judicialização se torna inevitável quando o sistema falha em atender o cidadão, mas aprimorar a gestão e planejar melhor os recursos podem ajudar a reduzir essas demandas. Há a necessidade urgente de ampliação a rede de atendimento.

A defensora frisa que quando um cidadão procura a Defensoria Pública em busca de um leito de UTI, normalmente já está em uma emergência médica/risco de morte.

Mesmo após uma decisão judicial favorável, a maior dificuldade é a efetivação da medida. Em muitos casos, não há leitos disponíveis na rede pública, e a ordem judicial precisa ser cumprida por meio da contratação de leitos em hospitais privados. Infelizmente, há registros de pacientes que faleceram enquanto aguardavam um leito, mesmo com ordem judicial expedida.